Dr. Marcos Lúcio Barreto
Promotor de Justiça do Meio Ambiente
do Ministério Público
Para Promotor, REPRESENTAÇÃO do MDM e CONSEGs pelo Desmonte do Minhocão é “para que a qualidade de vida das pessoas (que moram ou trabalham ao longo do elevado) que já está degrada há mais de quatro décadas , que esse martírio tenha um fim!
Isso é razoável.
Que se proceda o desmonte!
Não tem outra alternativa”.
Entrevista concedida ao repórter Filipe Sansone, do Diário de São Paulo, em 21/7/2015.
Repórter: O Sr poderia falar sobre a REPRESENTAÇÃO dos CONSEGs e MDM a respeito do Minhocão?
Dr. Marcos L. Barreto: Tudo começou bem antes da REPRESENTAÇÃO deles, havia uma ação proposta pelo Ministério Público contra a Prefeitura de São Paulo, pleiteando a construção de barreiras acústicas laterais ao longo do Minhocão, por conta da notória questão que envolve a poluição sonora ali existente.
Apresentei as alegações finais dessa ação civil e conseguimos a condenação da Prefeitura para que essas barreiras fossem construídas. A Prefeitura recorreu.
Por ocasião do recurso tive a idéia de me deslocar até o local e sentir aquela realidade. Na verdade a questão da poluição sonora , ela afeta mais as pessoas que se concentram abaixo das pistas do Minhocão.
Num primeiro momento, não me ocorria, num primeiro momento imaginava que o desconforto maior acometesse aqueles que ficassem no nível, acima das pistas do Minhocão.
Mas por conta da questão da caixa de ressonância que aquelas pistas vão criando, o desconforto maior é para a população que mora e trabalha na área abaixo das pistas do Minhocão.
Porque quem está no nível acima, encontra um desconforto semelhante a quem mora numa Avenida Brigadeiro Luís Antônio. Não é muito diferente daqueles que residem nas vias de intenso tráfego na cidade de São Paulo.
Mas no Minhocão, você tem um diferencial que é aquela questão daquela estrutura que existe, que estabelece essa caixa de ressonância que impede uma melhor dispersão dos poluentes e dos ruídos que são ali gerados.
Eu, a partir daquele momento então, a minha atuação se direcionou para que essa área , ali no Minhocão, fosse tratado com mais cuidado. E aí desencadeei uma série de providências, ao Poder Público, para ver se a gente conseguia amenizar aquela situação.
Sugeri a Secretaria de Transportes que efetuasse estudo quanto a possibilidade de transferência das linhas de ônibus para as avenidas vizinhas. Porque o grande gerador de ruído ali são os ônibus. Geram um desconforto maior. Motocicletas, ambulâncias também. Mas se tornou inviável essa alteração .
Então, a partir disso, ao verificar que essas alternativas não eram exequíveis, e quando surgiu a idéia da desativação do Minhocão como via de tráfego, abrindo a bifurcação , ou será um parque ou será desativado, em face de toda essa questão que acabei de apresentar, eu num primeiro momento entendi que a construção de um parque lá era inviável por conta dessa situação que acomete essa população que se concentra abaixo do Minhocão.
E até conversando com algumas pessoas que ali trabalham , ali residem, eu percebi que o desconforto lá é realmente muito grande. Basta você se dirigir lá , não precisa ser um técnico, não precisa ser um especialista, para você perceber o desconforto.
Aumenta o tráfego de veículos, conforme depoimentos que eu obtive, o desconforto se torna muito grande. O que seguramente aumentaria com a criação do parque. Porque na medida em que aquele trânsito todo, enorme, que se concentra nas pistas do Minhocão, ele automaticamente se transfeririam para as vias que ficam embaixo. E aí, o que é ruim vai ficar pior.
Daí essa situação, que num primeiro momento parece até esdrúxula, não é? O Promotor do Meio Ambiente que se coloca contra a criação de um parque. Seria um contrassenso absurdo! Ainda mais que eu que sou autor de uma iniciativa , já concretizada , que promove a arborização nas vias de intenso tráfego.
Fui autor de um projeto que foi implementado, um projeto piloto, na Avenida Vergueiro, a via ali foi arborizada com o apoio da iniciativa privada. Nos moldes do Projeto Pomar.
Quer dizer, eu sou um apaixonado por árvores, por arborização, todo meu trabalho aqui , é direcionado para que a vegetação em São Paulo seja dirigida para que mais áreas verdes sejam construídas. Não teria a menor lógica eu me manifestar contra a criação de um parque, que é sinônimo de arborização. Como um Promotor do Meio Ambiente vai se colocar contra um projeto de arborização na cidade?
Eu estou me posicionando dessa maneira contrária, porque eu não posso imaginar que pessoas se divirtam, se deleitem com um parque, enquanto outras estão sendo sacrificadas! Isso contraria qualquer princípio humanístico.
Então vamos resolver essa situação. Primeira , da saúde física e mental dessas pessoas afetadas por essa poluição sonora e atmosférica , com sua saúde física e mental prejudicadas, para depois a gente pensar em deleite, uma paisagem bela.
Você tem ali uma área degrada. Não é razoável você imaginar que aquilo possa subsistir. Idéia de se criar um parque para atender parte da população, que vai estar lá se divertindo enquanto outra parte está sendo sacrificada. Não tem o menor sentido. Contraria a lógica. Eu volto a dizer: contraria qualquer espírito humanístico.
Agora se algum gênio me apresentar uma solução que que resolva a questão da concentração dos poluentes e aqueles gases tóxicos, naquela região, a minha posição vai ser de apoiar a criação do parque, mas nenhum gênio nos apresentou a solução para isso.
O problema é estrutural!
É lógico que a gente precisa d emais áreas verdes, a gente precisa de mais parques, mas a gente tem que fazer todas essas coisas, incrementadas com inteligência. Desde que isso não traga prejuízo a cidade.
Repórter: Nesses termos, o ideal seria o Desmonte mesmo?
Dr. Marcos L. Barreto: Seria o Desmonte.
Porque a criação do parque, essa caixa de ressonância que é a causadora de todos esses males, ela vai subsistir. Então, não tem como.
Precisaria os urbanistas apresentarem alguma idéia. De repente tirar uma parte e uma parte que exista uma concentração maior, essa parte tem que estar livre dessa caixa de ressonância. Um outra que eventualmente não incomode as pessoas, poderia manter essa estrutura. Mas, nessas vistorias que eu fiz, confesso que eu não sai tanto para verificar se tem algum trecho com essas condições. Seria necessário, de repente, um estudo melhor. Um desmonte parcial. Acho que a gente não pode ser inflexível.
Poderia até ser verificado se existe alguma área que poderia receber o parque, sem que a construção desse fato trouxesse esses tais prejuízos à saúde dos moradores e trabalhadores dessa área abaixo das pistas.
Repórter: A caixa de ressonância seria o barulho dos ônibus, motos batem e volta.
Dr. Marco L. Barreto: As sirenes também. Aquilo tudo bate e volta. São três hospitais. Potencializa todos aqueles ruídos.
Há um mês atrás, mais ou menos, fui fazer lá uma enquete informal com as pessoas que moram e trabalham lá. E eu ouvi – eu fui de metrô – saindo da estação Marechal Deodoro, o primeiro prédio comercial à direta de quem sai, tem um senhor lá que é porteiro há nove anos e ele me disse que ele está com surdez em um dos ouvidos, decorrente da exposição dos ruídos que ele estava exposto há nove anos. Ele nem sabia quem eu era, nem do que se tratava.
Nessa enquete que eu fiz, as pessoas em via de regra relatavam esse desconforto.
Eu trago esse caso mais agudo dentro de um universo pequeno, mas importante essa pessoa que me relatou que estava com problema auditivo , surdez em um dos ouvidos e na avaliação dele, era decorrente daquela poluição sonora concentrada dali.
Repórter: E essa REPRESENTAÇÃO consiste em que?
Dr Marcos L. Barreto: Ela quer que o Ministério Público encampe essa pretensão deles, que a criação de parque não saia do papel.
Que esse projeto de lei não vingue.
Para que então a qualidade de vida dessas pessoas que já está degrada há mais de quatro décadas , que esse martírio tenha um fim!
Isso é razoável.
Que se proceda o desmonte!
Não tem outra alternativa.
Com isso, naturalmente haveria uma reurbanização naquela área, trazendo um alívio para aquelas milhares de pessoas que ao longo de todos esses anos sofreram com aquela construção que é tão criticada.
E agora, já que é para desativá-la como via de tráfego, porque o Minhocão foi construído , essa obra que se tornou quase que uma unanimidade em termos de reprovação, o que motivou a construção do Minhocão, essa obra tão repudiada, por todos praticamente, necessidade de São Paulo ter uma via que desafogasse o tráfego .
Se agora se entende que aquilo não é mais necessário como via de tráfego, então a gente tem uma razão a mais para entender que aquilo que é tão criticado, deixe de existir.
A causa motivadora que era aliviar o tráfego , entende-se que pode ser de alguma maneira substituída, então não tem mais razão, aquele monstrengo estar ali de pé.
Repórter: Perfeito.
Dr. Marcos L. Barreto: Ele está ali para desafogar o trânsito. Mas se entende que ele não tem mais necessidade, então para que mantê-lo?
Repórter: Perfeito. Está ótimo.