Leão Serva
Leão Serva é Ex-secretário de Redação
da Folha, jornalista, escritor e coautor de
‘Como Viver em SP sem Carro’.
Escreve às segundas, quinzenalmente
Coragem, Haddad:
feche o Minhocão!
28/03/2016
Em recente palestra para estudantes, o prefeito Fernando Haddad disparou a ideia de fechar o Minhocão por certo período de tempo, para ver o que acontece: “Vamos fechar por um mês, dois meses, três meses? Vamos estabelecer um prazo para ver como a cidade vive sem isso por um tempo”.
Se falava sério, o prefeito vendeu mal o peixe; se era só um factoide, melhor que não tenha chamado muita atenção do leitor.
Haddad é um prefeito “desigual e combinado”, conforme a expressão de Leon Trotsky sobre o desenvolvimento das nações.
Sua administração amarga retrocessos importantes em áreas como saúde, educação, habitação popular e limpeza urbana, entre outras. E anota avanços marcantes em mobilidade: melhorou o desempenho do sistema municipal de ônibus, ao multiplicar faixas exclusivas; criou uma rede de ciclovias, que tem defeitos porque existe; diminuiu a velocidade dos carros, reduzindo acidentes e mortes no trânsito.
No caso do Minhocão, sua postura tem sido ambígua desde a campanha eleitoral. Em 2012, dizia ser favorável ao fechamento do Elevado “quando houvesse uma nova avenida para substituí-lo”.
Eleito, manteve-se distante da discussão até que, dias atrás, assinou lei do vereador Police Neto, que dá o nome de “Parque Minhocão” à avenida quando é fechada para o trânsito de veículos. Um avanço de natureza simbólica.
Se tivesse dirigido ao Elevado o mesmo
empenho de outras batalhas no trânsito,
talvez já tivéssemos demolido o monstrengo
criado por Paulo Maluf, como o Rio fez com o
seu (e ninguém sente falta).
A prefeitura não precisa testar o fechamento, a engenharia de tráfego permite prever que a cidade não sofrerá sem o Minhocão, ao contrário, o trânsito vai melhorar.
Estas são cinco razões: (1) o Elevado é ineficiente, passam por ele apenas cerca de 70 mil carros/dia (levando 80 mil pessoas), quase nada no universo da cidade; (2) os carros que vão do Leste ao Oeste já têm alternativa para seu deslocamento, vias paralelas criadas nas últimas décadas; (3) em 1970, Campos Elíseos era cheio de trânsito.
Hoje, não é mais, se tirar as faixas de estacionamento, suas ruas dão conta do trânsito local que “descerá” do Minhocão; (4) a ciência mostra que, em caso de fechamentos de vias, as pessoas buscam a alternativa menos demorada, seja outro caminho ou outro modo de transporte (alguns usuários reduzem viagens de carro); (5) quando se cria uma nova via, com a melhora imediata do trânsito, carros que ficariam parados vão para a rua, o que aumenta o trânsito em vez de reduzir.
É o que ocorreu com a marginal Tietê desde 2010, hoje mais congestionada que antes. Já quando se fecha uma via, carros que iriam para a rua, são deixados em casa, reduzindo o conjunto de automóveis em movimento na cidade.
Ou seja, embora o efeito inicial do fechamento de uma via possa ser traumático, em curto prazo, o resultado já é positivo. Veja o que aconteceu com a Paulista aos domingos.
Portanto, não há porque hesitar. Fechar o Elevado não vai causar dano ao trânsito maior do que criar um corredor de ônibus em uma avenida: em pouco tempo as pessoas encontram suas soluções, seja o uso de transporte público ou um outro caminho.
Coragem prefeito: feche o Minhocão, não por um mês ou um ano, mas para todo o sempre.
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/leaoserva/2016/03/1754498-coragem-haddad-feche-o-minhocao.shtml