Em Entrevista a TV FOLHA, Especialista em Trânsito desmistifica o papel do Minhocão

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TV FOLHA ENTREVISTA DR. SERGIO EJZENBERG

SOBRE “O FUTURO DO MINHOCÃO

NR: Sérgio Ejzenberg é colunista de transporte e trânsito do

SPTV – TV GLOBO

Mestre em engenharia de transporte, Ejzenberg é consultor da ONU.

Ele foi colaborador da CET de São Paulo durante 15 anos.

 

     Sérgio Ejzenberg é engenheiro civil e mestre em Engenharia de Transportes pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP).

 

     Tem especialização em Transportes realizada na França através da Agência para a Promoção Internacional das Tecnologias e das Empresas Francesas (ACTIM).

 

     No SPTV 1ª edição, trata sobre transporte e trânsito.

 

     É engenheiro consultor da Organização das Nações Unidas (ONU) no Programa de Desenvolvimento de Transportes para Bogotá/Colômbia.

 

     Foi colaborador da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) por 15 anos. É também consultor de engenharia de tráfego e de segurança viária. Sérgio também é colaborador do Conselho Estadual para Diminuição dos Acidentes de Trânsito (Cedatt), da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) e do Ministério Público Estadual.

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TV FOLHA Reporter Pedro Ivo

     Pedro Ivo ToméRepórter da TV FOLHA: Estamos começando mais um AO VIVO TV FOLHA. O tema de hoje é O FUTURO DO MINHOCÃO. Estou aqui com o Engenheiro e Mestre em Transportes, Sr. Sérgio Ejzenberg. Ele foi também colaborador durante anos da CET – Companhia de Engenharia e Transportes – aqui em São Paulo.

     Dr. Sérgio Ejzenberg – Agradeço a oportunidade, porque? Porque todo mundo tem uma idéia sobre o Minhocão e ninguém conhece nada sobre o Minhocão.

     A população tem medo – inclusive os usuários – de que na hora que aquilo fechar, a cidade vai parar… Existem posições filosóficas.

     É preciso antes de mais nada desmistificar e saber o que acontece ali. O que é o Minhocão? Para que que ele serve? Se ele tem remédio… se ele não tem … o que que ele causou… o que que ele vai continuar causando… com “parque” ou sem “parque” lá em cima.

     É preciso informar a população, para que se percam medos. Que se discuta a coisa com base técnica. E está faltando informação. Filosofia sobre isso tem bastante. A idéia do parque é maravilhosa. Quem é contra um parque? Vai resolver a degradação?

     Então, a primeira coisa que a gente tem que ver não é só desativar ou não. Aquela estrutura elevada… se colocar lá em cima ouro… parque, ou carro ou nada, vai alterar alguma coisa lá embaixo? Não vai alterar absolutamente nada!

     Qualquer estrutura urbana elevada, traz imediatamente a degradação . Então, se a gente quer recompor, recuperar a cidade que ficou destruída do ponto de vista de ambiência urbana, por conta daquele monstrengo, é bom saber que o que for que se coloque lá em cima, embaixo continuará degradado.

     Com um agravante: se nós matarmos a alternativa viária que hoje é o Minhocão, mantendo aquela estrutura, embaixo obviamente ficará mais congestionado. Portanto, o comércio que tenta sobreviver naquela região inóspita e hostil vai terminar de morrer! Então, acelera a degradação. Acelera o que já hoje tem. Então toda a área que congestiona por demais, degrada do ponto de vista urbano. Então, nós teríamos uma estrutura elevada, um congestionamento infernal e o resultado é que acelera a degradação. E não tem volta, com aquela estrutura lá. (…)

     Então, veja, pode ser a estrutura quer for. Se for elevada, ela traz degradação e não tem remédio para isso. Portanto, o Minhocão continuando lá, na General Olímpio da Silveira, na São João, na Amaral Gurgel, em toda aquela região, vai… seja o que for que tenha lá em cima, vai causar degradação urbana.

     O mundo inteiro está eliminando suas estruturas elevadas. É o que nós temos que fazer. Então essa é minha posição. Para que a cidade seja resgatada, nós precisamos destruir aquilo . E não adianta colocar parque lá em cima que não vai melhorar. Pelo contrário. Com o congestionamento vai piorar o trânsito. Portanto, agravar com mais esse fator, a degradação urbana pela quebra geral do comércio.

     Então, a discussão que ele coloco é : em que momento e como deve ser feita a demolição do Minhocão. Porque simplesmente fechar aquilo, vai causar um trauma. Então é preciso primeiro entender isso.

     A Prefeitura tem obrigação de esclarecer a cidade com mais dados. Mas eu vou dar para todos, informações que são basicamente importantes para decidir da sua importância estratégica Minhocão. Vamos pensar na ligação leste-oeste. A chegada na Praça Roosevelt vem com três faixas de tráfego. E depois aparece o Minhocão, a Amaral Gurgel. Então, o que acontece é que há uma abertura, depois da Praça Roosevelt , mas o gargalo está antes. Então, no sentido da Praça Roosevelt, no sentido pegando o Minhocão, nesse sentido o Minhocão não faz falta. Porque a capacidade de alimentação com três faixas… se eu tirar o Minhocão , sumir com aqueles pilares, que são enormes, que geram um canteiro central enorme, eu resgato a largura original daquela via sem os pilares, eu consigo dar a capacidade que tem em cima, embaixo. E mais: quando termina o Minhocão, lá na Francisco Matarazzo, nem três faixas tem. Tem duas só. Então não adianta eu querer grande capacidade num sentido, se só passam duas faixas. Que a Francisco Matarazzo tem três faixas de tráfego. Uma é corredor de ônibus e duas são carro.

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O Minhocão não faz falta nenhuma“,

afirma o especialista em trânsito, Dr. Sérgio Ejzenberg

     Então, nesse sentido o Minhocão não faz falta nenhuma. Do ponto de vista estratégico para a cidade como um todo. E no sentido oposto é a mesma coisa. Porque você tem a Amaral Gurgel chegando na Praça Roosevelt pelo Minhocão, tudo se aperta num nada, e fica um grande estacionamento no pico da tarde: em cima do Minhocão e na Amaral Gurgel. Com ou sem o Minhocão… o limite é a Praça Roosevelt… e a ligação leste-oeste. Aquilo não muda. Então o Minhocão, numa hora de pico, não serve como alternativa de tráfego, mas como um grande estacionamento elevado. Então, a sua eliminação e o aproveitamento do canteiro central , tanto da São João, quanto da Amaral Gurgel, que é enorme e que não serve para nada e pode ser estreitado e aumentando a própria capacidade da Amaral Gurgel, nós temos pelo menos uma faixa a mais por sentido.

     Como é que a gente pode conseguir mais capacidade? É outro problema que a Prefeitura não resolve. Os semáforos daqui de São Paulo são pessimamente geridos. O sistema não funciona. Se ele funcionar ele consegue dar uma redução na hora de congestionamento na ordem de 20%. Se a gente coloca semáforos inteligentes em toda aquela região e requalifica as avenidas por baixo do Minhocão, nós conseguimos a capacidade necessária, sem aquela estrutura. Então, é como fazer isso. Com que estratégia fazer. Mas do ponto de vista estratégico, veja Pedro, o Minhocão não faz falta e não depende de metrô, nem investimentos para daqui a quinze anos. É uma coisa para já! A lógica indica que aquela obra jamais deveria ter sido construída.

     Pedro Ivo Tomé: Entendi. Então, só para esclarecer e resumir, na sua opinião, da duas uma: ou mantém o Minhocão como está, servindo para o tráfego de veículos, ou leva abaixo e faz uma série de reformas estruturais para que o tráfego não seja prejudicado. Mas, parque, não.

     Dr. Sérgio Ejzenberg: Não é manter indefinidamente. Essa estrutura está condenada. Ela já tem cinquenta anos. Nada é eterno. Agora, já, sob pena de começar a cair coisas, é preciso iniciar um processo de reforma daquilo. Então, a pergunta é: vamos reformar aquilo ou botar abaixo? O botar abaixo não é nenhum desastre. Botar abaixo uma estrutura que levou treze meses para ser construída, talvez seja feita em seis meses.

     A cidade conviveu com interdições muito piores . Se você vai ver, quando foi construída a linha norte-sul do metrô, as Avenidas Jabaquara, Lins, as avenidas ficaram interditadas por quatro, cinco anos. E depois veio o Metrô que levantou a região.

     Então, se a gente ficar, uma obra de seis meses e criar alternativas para isso, até os próprios aplicativos de celulares vão informar que esses caminhos alternativos sejam feitos, a gente sobrevive a fase de obra rápida, que pode ser só no período noturno, porque é só desmonte de vigas… não precisa britar aquilo… é só desmontar as vigas… aquilo é pré-moldado… desmonta rapidamente… demole os pilares e reconstitui a capacidade das vias que estão debaixo.

     Pedro Ivo Tomé: Entendi. Uma outra pergunta que eu gostaria de fazer é que alguns especialistas apontam que transformando aquela região do Minhocão em um parque, por exemplo, ou fechando ela, como acontece agora no domingo, a privacidade dos moradores dos prédios do entorno do Minhocão ela ficaria prejudicada, porque hoje, o carro trafega ali, numa velocidade de uns 50 kms por hora e a pessoa fica concentrada na via. Mas quando ela está em cima do Minhocão, ela pode parar, olhar para os apartamentos, isso poderia prejudicar a privacidade dessas pessoas. Essa proposta (“parque”) não pode já piorar e gerar um transtorno nesse sentido?

     Objetivamente: o que poderia ser feito para melhorar então a privacidade das pessoas que estão nesses prédios? O que o Poder Público pode fazer para que enquanto o Minhocão , ou não seja levado abaixo, ou se mantém essa proposta de se tornar um parque , pelo menos no sábado e no domingo, o que o Poder Público poderia fazer para suavizar esse impacto na privacidade na vida das pessoas ali, nos prédios que estão ao redor do Minhocão. (…)

     Dr. Sérgio Ejzenberg: Quando eu menciono que a retirada da estrutura do Minhocão, dos seus pilares, permitem requalificar a via, eu usei a palavra requalificar a via. Não transformar aquilo num mar de automóveis. A via tem ônibus , tem bicicletas, a via deve portanto, passar por uma requalificação … ao invés de ficar um corredor de ônibus espremido numa caixa de fumaça, que é mortal para a saúde, ele vai ficar num canteiro central com árvores, ou seja, não se está dizendo que é para resgatar essa via para expulsar o uso, para ciclovia que pode servir também para corrida, ao invés de ser sob um sol escaldante, numa região arborizada, que o Minhocão não permite, não tem como arborizar aquilo, porque se eu vou usar para parque por algum tempo , eu vou colocar e tirar a árvore de lá.

     Então, se eu vou resgatar, eu vou resgatar mesmo. Como a Faria Lima foi resgatada. Como a Berrini foi resgatada. Fazer uma utilização inteligente e racional, colocando ônibus em prioridade, porque é obrigação da Prefeitura fazer corredor de ônibus, isso ela tem que fazer… e ainda com isso ter mais espaço para mais capacidade porque se o espaço público existe ele deve ser utilizado com inteligência. E ele foi usado de uma maneira muito burra ali, de uma maneira destrutiva. (…)

     Ou seja, não tem jeito. Pode colocar o que for. Qualquer estrutura elevada ela traz uma degradação em cidades ricas, com polícia em cada esquina. Portanto, não funciona. Então o que eu quero dizer, nós temos que requalificar.

     Então essa discussão ela tem que se levar em conta, a ser conduzida, não pela Prefeitura que tem interesses. Eu diria que o fiel da balança , ouso dizer aqui, teria que ser o Ministério Público. Porque a gente vai com frequência a Audiências Públicas, e quem conduz o microfone está interessado num projeto… Portanto não é isento. Mas ao passo que a condução de Audiência Pública , após pesquisa com os moradores… o que você acha? Vai ficar bom ou vai ficar ruim? O morador hoje sabe… porque ele já tem o domingo uma experiência de uma maior ou menor privacidade… Então é preciso ouvir os moradores também… mas de uma maneira isenta, desvinculada de interesse “faz parque… não faz parque”… “demole … não demole”…

     Para ouvir com isenção a população. Não fazer nada com açodadamento. Não investir em algo que vai vir a ser derrubado, para não cair. Então essa análise técnica, com informações claras, com transparência total, com informações como agora a FOLHA está permitindo, para saindo os medos, os receios, os sonhos e os devaneios, e conseguirmos efetivamente resgatar a cidade.

Eu tenho absoluta certeza, estou convencido, nada que fique de pé ali vai resgatar aquela região. Pode prejudicar pelo fechamento lá de cima , de uma maneira mais intensa, e terminar de matar o comércio que tenta em sobreviver lá embaixo. Nós vamos andar para trás então e acelerar a degradação urbana… Isso vale para Minhocão, qualquer Metrô elevado, até para monotrilho. Se a gente for ver as estações de monotrilho que estão sendo feitas na Roberto marinho, por exemplo, estão surgindo Minhocões aéreos …

     A cidade é valiosa demais para que o espaço público seja utilizado por estruturas aéreas. Nós temos que deixar o espaço público liberado . O Minhocão ele enterrou várias praças… o Minhocão enterrou o Largo de Santa Cecília, a Praça Marechal Deodoro… são lugares maravilhosos… estão sufocados… Na hora que a gente tirar, vai reaparecer … o espaço público está lá… debaixo do concreto…

     Então, a tirar o Minhocão, eu não estou aqui falando em transformar aquilo num asfalto reluzente. Eu estou dizendo que a cidade vai resgatar suas praças, resgatar espaços, arborização de grande porte, acabar com a ilha de calor que tem lá… Não tem uma árvore naquela região. Não cabe. Na calçada não cresce… No Minhocão não pode… embaixo não dá porque é sombra… Então não tem árvore… Com aquela estrutura, eu vou colocar uma árvore de plástico lá em cima? Não adianta!

     É preciso rebentar aquilo, colocar um canteiro bom , arborizar o canteiro central e recriar aquilo para o   ser humano. O nível do chão é valioso demais para ter outro uso, qualquer outra estrutura. Essa é minha posição em relação a essa estrutura.

     Pedro Ivo Tomé: Entendi. Então essa posição Sr. de criar esse parque suspenso ela é mais paliativa do que resolutiva.

     Dr. Sérgio Ejzenberg: Porque ele vai exigir investimentos para proteção anti-ruído, proteção anti-visual, isso envolve reestudar a estrutura. Porque na hora que vai se colocar uma peça alta e pesada na borda, eu tenho que verificar a resistência estrutural daquilo , que pode não ter. Investir numa estrutura que já está com os dias contados, se não for reformada. E aí tem a pergunta: vamos reformar ou vamos demolir?

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O Minhocão não tem função de tráfego relevante“,

afirma o especialista em trânsito, Dr. Sérgio Ejzenberg

     E por isso que eu coloco: analisemos a condição do tráfego e a gente percebe que ele não tem função de tráfego relevante. Que já tinha ouvido na CET. Portanto, esse debate carece de mais informação da área técnica . Dizer que passam 80 mil veículos no Minhocão, pode não ser nada. Pode ser que esses 80 mil passassem por baixo, com facilidade. Como? Aonde? Em que horário? No horário de pico não fica tudo parado? Então, é zero. Então, no horário de pico é como se ele não existisse.

     Então é preciso enxergar a função daquilo. E mais: com relação ao modelo rodoviarista, nós sabemos que hoje em São Paulo, mais gente anda de carro do que anda de ônibus. Mais gente anda de carro do que anda de metrô. O pessoal anda de automóvel não é porque adora o automóvel. Anda de automóvel porque o ônibus demora duas vezes e meia a mais. O bem mais precioso para uma pessoa é sua vida e seu tempo. Então se posso fazer uma viagem mais rápida, vou fazer. Só se meu bolso não permitir.

     Agora, quando o Poder Público oferece uma alternativa, que não o automóvel, o paulistano imediatamente aceita e acata as boas alternativas . (…)

     Pedro Ivo Tomé: São Paulo depende do Minhocão para circulação de veículos? Sim ou não? O Minhocão não deveria existir fisicamente, ele não faria falta? Se o Minhocão fosse colocado abaixo e reformulada a Amaral Gurgel, ele não seria necessário?

     Dr. Sérgio Ejzenberg: Não só a Amaral Gurgel, como a General Olímpio da Silveira e a São João. Não precisaríamos nada para que São Paulo funcionasse exatamente igual. Completando. Fazendo com que o sistema de semáforos funcionasse com semáforos inteligentes . Com o que está não dá para funcionar. Porque se errou no passado? Porque alguém resolveu fazer aquela obra e fêz em 13 meses. Não consultou ninguém. Fez porque quis. Está lá. E o resultado é esse desastre. Essa desgraça urbana . Essa área deteriorada que agora se pensa no que fazer. 

     Estou sabendo que o IPT está estudando isso. Maravilha. É um cabedal de ciência e sabedoria. Fazer isso com a participação do Ministério Público, isenta , que possa ajudar a, sem pressões, de interesses, se construa a solução melhor para a cidade num timing correto. Num esforço não só do IPT, mas da Escola Politécnica, com sua Academia de Transportes, da qual eu tenho a honra de ter saído. São pessoas que com sua sabedoria e ciência ajudarem a trazer informação que vai ajudar não só a Câmara, como a população como um todo a tomar uma decisão.

 

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