Jardins verticais
O que pensar?
O projeto e a realidade
por David Abrão Calixto
PRESIDENTE DA APAJAFESP
ASSOCIAÇÃO DOS PAISAGISTAS, JARDINEIROS, FLORISTAS, ECOLOGISTAS E EMPRESAS DO SETOR
Assistindo dias atrás, programa de tv, vi propaganda de proposta de se instalar “jardins verticais”, em paredes laterais de prédios ao longo do Elevado Costa e Silva – Minhocão.
Nesta cidade que é uma selva de concreto, toda iniciativa de instalação de área verde deve ser vista com simpatia e acolhida com empenho, após se ver sua viabilização. Os jardins verticais anunciados ao longo do Minhocão terão benefícios como redução da alta temperatura dessa ilha de calor que é o elevado, conforto pela redução do barulho, diminuição da poluição e conservação da fachada (evitando ações de pichadores).
Ocorreu-me como Presidente da Apajafesp, associação dos paisagistas, jardineiros, floristas e ecologistas de São Paulo, escrever outras considerações que afloraram ao meu espírito, vendo a propaganda dessa iniciativa, aliás, altamente dispendiosa, sendo que um dos principais empecilhos é o alto custo: a partir de R$ 800,00 por m² de empena, já que é preciso manter um sistema automático de irrigação e fertilização. E os resultados parecem ser questionáveis como veremos a seguir.
Em relação ao custo-benefício, ressalto que a instalação e/ou reforma de área verde na horizontal tem custo de R$ 100,00 por m2 , sendo privado ou público. E no item novas instalações de novas áreas verdes – que diga-se de passagem, se faz mais do que necessário em nossa cidade – por exemplo, canteiro em calçada, tendo 2m x 0,50 de largura, contendo uma árvore de pequeno porte , quatro arbustos de porte médio, forração e adubação tem custo de R$ 450,00 cada um.
. Em primeiro lugar, deve-se ter presente que os edifícios e condomínios são regidos por uma “constituição”, ou seja, sua Convenção/Regulamento. Ela estabelece normas objetivas para preservar a integridade do prédio , disciplinar e ordenar a boa convivência entre os condôminos, evitando-se assim entre outras coisas, eventual arbítrio da figura do Síndico que de dois em dois anos se alterna na administração.
Uma dessas regras estabelecidas pela Convenção dos condomínios, em conformidade com o que determina a Lei número 4.591 e outras posteriores, é a de que não é permitida alteração da fachada do edifício:
“Capítulo X – É Proibido – (…) 5º ) Efetivar qualquer modificação que altere a forma ou aspecto externo do Edifício”.
Consultado o SECOVI-SP, Sindicato da Habitação, a respeito do assunto jardins verticais, assim se pronunciou o Sr. Alexandre Callé, Assessor Jurídico – Departamento Jurídico SECOVI-SP:
(…) “Alguns cuidados devem ser observados pelos condomínios, de modo que não acarrete prejuízos aos seus condôminos. Por exemplo, deverá o profissional responsável pelo projeto demonstrar que a instalação do jardim não irá comprometer a impermeabilização da edificação diante possíveis vazamentos, infiltrações e até mesmo bolor dentro das unidades.
Deverá ser observada a questão da manutenção do jardim, pois, não é um sistema fácil de ser tratado, até mesmo diante da altura em que os trabalhos deverão ser realizados, com a observação das normas de segurança aos funcionários.
Apesar das vantagens, o custo para a instalação e manutenção do jardim vertical é muito alto, podendo implicar gastos excessivos aos condôminos.
É necessário manter um sistema automático de irrigação e fertilização. Logo, é importante que o assunto seja tratado previamente em assembleia com muito esclarecimento e cuidado.
Outro aspecto que deve ser observado é com relação à segurança e à viabilidade técnica do projeto, para que a edificação não sobra prejuízos futuros em sua estrutura e também não cause danos às unidades privativas.
Superada a questão técnica, o próximo passo é a aprovação em Assembleia Geral, especialmente convocada para a deliberação sobre o assunto.
Apesar da controvérsia que cerca o tema predomina, o entendimento é que qualquer tipo de obra que implique na alteração da fachada, reclama o quórum unanime (100%) de todos os condôminos da edificação (art. 1.336, III, do Código Civil)[1].
[1] Art. 1.336. São deveres do condômino: III – não alterar a forma da fachada, das partes e esquadrias externas;
O espírito da lei contido no art. 1.336, III, do Código Civil, que estabelece da vedação de ser alterada a fachada, decorre da necessidade de preservação das condições estéticas e da estrutura arquitetônica do conjunto, que é patrimônio comum dos condôminos.”
Além das ponderações do Assessor Jurídico do SECOVI-SP, ocorre-me as seguintes questões sobre a instalação de “jardim vertical”, na parede externa de edifício:
1º ) com sua instalação, a contínua umidade gerada pela água, não ocasionará infiltrações nas paredes dos apartamentos?
2º ) a instalação e manutenção de todo o mecanismo para manter o “jardim vertical” não resultará em aumento substancial na conta de água e de luz para o prédio?
3º ) essa parede do “jardim vertical”, continuamente umedecida, não atrairá mosquitos e outros insetos, ocasionando doenças nos moradores e obrigatoriamente aumentando gastos com dedetizações mais frequentes etc?
4º ) diante da crise hídrica pela qual passamos, sem perspectiva a curto e médio prazo de se restabelecer a normalidade do fornecimento do abastecimento de água para consumo da população, será razoável esse gasto extra de água, para manter um questionável “jardim” pendurado nas laterais de prédios, desafiando a lei da gravidade?
No caso de arrependimento de uma administração condominial na instalação do “jardim vertical”, o contrato pode ser rescindido? Há multa? Sim ou não?
Tenho informações de prédio que teve amarga e dolorosa experiência com a instalação de “jardim vertical”, com todos os aspectos negativos acima enumerados.
Uma pergunta que não quer calar: porque a iniciativa de “jardim vertical” se restringe, no momento, quase apenas aos prédios ao longo do Elevado Costa e Silva – Minhocão e não a outros bairros da capital e não começaram por exemplo pelo Braz, onde é um dos locais que tem menos área verde por metro quadrado?
E para finalizar, uma última pergunta. Não é mais simples e menos oneroso desmontar essa “cicatriz urbana” que é o Elevado Costa e Silva – Minhocão, como o rotula os maiores especialistas na matéria?
Porque não fazer ao longo de seus três quilômetros e quatrocentos metros de extensão belo boulevard ou bela avenida, ajardinada, florida, com árvores de grande porte?
Através delas se teria o fenômeno efeito clorofila que atraia nuvens/chuva para nossa cidade tão carente de água. E assim não teríamos a perpetuação dessa horrível ilha de calor de concreto e asfalto, que é o Minhocão, área degradada onde há 45 anos não entra um único raio de sol, com altos níveis concentrados de poluições atmosférica, sonora e visual que agridem a saúde da população?
Não é mais simples jardim no chão, mais natural, mais orgânico e que os próprios comerciantes cuidariam, por ser como que um “cartão de visitas” em frente de suas lojas, evitando assim gastos onerosos para a administração municipal?
Numa região central, que carece de postos de saúde, creches, hospitais municipais, CEUs etc, será razoável esse gasto de milhares de reais em instalação de cada “jardim vertical”, iniciativa meramente estética, aliás, altamente dispendiosa e de resultados questionáveis como expomos?
Entre o projeto e a realidade, não poderia me omitir em compartilhar com você essas ponderações, após ver na tv a custosa propaganda do “jardim vertical”.
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