Minhocão: 50 anos de uma cicatriz urbana

CRÔNICA

Minhocão: 50 anos de uma cicatriz urbana

Lúcio Gomes Machado  (*)

           Há 50 anos, com muita festa, Paulo Maluf então prefeito, inaugurava, no dia do aniversário da Cidade de São Paulo uma obra que, na sua opinião, seria lembrada, no futuro, como um símbolo de sua capacidade de realização de obras.  É verdade:  o Minhocão foi realizado em curtíssimo prazo, com técnica construtiva avançada, mas sem qualquer estudo mais profundo sobre seus impactos ambientais e sociais. Tipicamente uma obra populista.

          Maluf atingiu vários de seus objetivos. Implantou uma via que “ligava a fabrica do papai à casa da mamãe” e contemplava empreiteiras que ganharam a concorrência com base em um anteprojeto ( portanto sem projeto executivo e, assim,  puderam fazer o que bem entenderam para construir a “coisa”).

          Ao inaugurar, pode bajular o padrinho da sua nomeação como prefeito, designando o grande viaduto como “Elevado Costa e Silva”.  Para os mais jovens é bom lembrar que durante a ditadura, os prefeitos das capitais eram nomeados e não eleitos tendo assim poder absoluto sobre a cidade.

    

          Mas quem pagou toda a conta foi São Paulo. O Minhocão como depreciativamente a população denominou a obra, até mesmo para não lembrar o nome oficial, depois do fim do regime militar, tornou-se uma das maiores chagas urbanas, uma incrível cicatriz cortando o tecido urbano. O entorno foi desvalorizado, os moradores da redondeza sujeitos permanentemente a tortura com poluição atmosférica e terrível nível de ruído, e na parte de baixo, a concentração de gases de escapamentos de ônibus e carros abafados pela estrutura.

          Nem é necessário lembrar que a região se tornou local de degradação social e econômica, além de depósito permanente de lixo.

          

          Hoje, o Minhocão é um símbolo do atraso, do subdesenvolvimento, de uma cidade que valoriza o automóvel em detrimento da qualidade de vida.  Para esconder isto, alguns propõem implantar sobre o monstro, um jardim artificial. Solução mais uma vez inaceitável, tanto quanto maquiar um moribundo para levá-lo a uma festa. A verdade é que a sua estrutura nunca foi objeto de manutenção. As patologias construtivas são evidentes e corre-se o risco de um desastre como ocorrido em nossa cidade com vários outros viadutos mais jovens.

     

          O Movimento Desmonte Minhocão tem lutado para a única solução digna: o desmonte e o reaproveitamento de todas as peças estruturais, operação que já foi orçada, concluindo-se que haverá  ganho e não despesa para a Prefeitura. 

   

Amaral Gurgel sem Minhocão

          Mas haverá  ganhos significativos para a sociedade, com a valorização da paisagem da região, com recuperação da saúde de seus moradores e a retomada do potencial de desenvolvimento urbano da região.

          E mais: apagará um episódio lamentável da história de São Paulo.

Lúcio Gomes Machado

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                 (*) Dr. Lúcio Gomes Machado – Possui graduação em Arquitetura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (1969), Mestrado (1881) e Doutorado (1992) em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo ).

          Atualmente é professor doutor do Departamento de História da Arquitetura e Estética do Projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.

          Socio-Diretor de GMAA – Gomes Machado Arquitetos Associados Ltda e Linha d´Água Difusão Cultural Ltda.

          No Instituto de Arquitetos do Brasil, foi membro de seu Conselho Nacional, diretor do Departamento de São Paulo, no qual atuou como Vice Presidente.

          Foi Coordenador Geral e Diretor da seção brasileira do International Working Party For Documentation And Conservation Of Buildings.

          Foi Conselheiro do CONPRESP e do CONDEPHAAT.

          Foi Curador da III e da IV Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo.

          Tem experiência nas áreas de Arquitetura e Urbanismo e de Desenho Industrial, com ênfase em História da Arquitetura e História do Design.

          Atua profissionalmente nas áreas de Arquitetura e Urbanismo, Desenho Industrial, Programação Visual e Construção Civil, além de Editoração e Preservação do Patrimônio Cultural e Arquitetônico.

          Graduado pela FAU Mackenzie em1969.

          Mestrado e Doutorado na FAU USP.

          Professor de História da Arquitetura na FAU-Santos (1973 a 85) e de História da Arquitetura e do Design na FAU/USP desde 1972.

          Curador das 3ª e da 4ª Bienais Internacionais de Arquitetura.

          Conselheiro de CREA-SP por 12 anos.

          Ex Vice-Presidente do IAB-SP, do SASP e do CREA-SP.

          Desde 1979, dirige escritório atuante em projetos e gerenciamento de obras institucionais, industriais e de restauro.

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Movimento Desmonte do Minhocão

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